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Há livros que têm que ser lidos com urgência, sob pena de já estarem desatualizados quando lá chegarmos. Este é talvez o melhor exemplo de um livro que deve ser lido, de preferência, no dia em que saiu. Isto porque Friedman é absolutamente extraordinário na forma como identifica as tendências e tira conclusões dos casos particulares para chegar ao geral. De qualquer forma, mesmo lendo-o com atraso de anos ,é ainda altamente compensador. Por um lado, até se torna divertido perceber onde é que Friedman acertou e onde é que falhou.

Falando um pouco do conteúdo. Friedman apercebeu-se, a certa altura, que o mundo estava a ficar plano. O que é que isto significa? No fundo, trata-se da possibilidade cada vez maior de interagir com pessoas bem longe de nós, deslocalizar serviços, recorrer a outsourcing no estrangeiro, ter a mesma música em zonas completamente diferentes e distantes, vestirmo-nos de forma parecida, termos os mesmos ídolos, etc, etc. Numa expressão: a globalização tornou o mundo plano. Ora, o que é aqui feito é uma análise do fenómeno, tanto do ponto de vista das mudanças que provoca, como das tendências que se começaram a desenhar.

A perspetiva de Friedman é intensamente otimista, para não dizer eufórica. Por isso, claro que será criticado por muitos. É verdade que um pouco mais de equilíbrio, e até mesmo prudência, não ficariam mal. Mas é uma obra fascinante pelos casos que conta, pelo entusiasmo da escrita, pela capacidade de partir do micro para chegar ao global. Há tanta falta de visão no que se vê por aí que é uma autêntica lufada de ar fresco ler quem está mais interessado na realidade do que nos preconceitos.

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Pensei melhor. Em vez de, tal como tinha prometido, vir a escrever um texto sobre os terríveis acontecimentos de Kalavrita na 2ª Guerra Mundial, achei que era melhor ser o Ricardo a fazê-lo. E é também um momento especial poder partilhar o meu blog com ele. Volta sempre!

 

 

O Holocausto de Kalavrita

A melhor forma de chegar a Kalavrita (na região de Achaia, no norte do Peloponesso) é apanhar a famoso comboio que, partindo de Diakopto, numa lenta ascenção, nos leva pelo grande desfiladeiro de Voraikos, acompanhando o rio com o mesmo nome, numa viagem de cerca de 22 kms inesquecíveis(e assustadores), de que já se falou aqui. A viagem dura cerca de uma hora e, à chegada à estação, estamos praticamente no centro da vila.

O museu é muito perto. Inaugurado em 2005 com o nome de Museu Municipal do Holocausto de Kalavrita, ocupa o lugar da antiga escola primária, onde no dia 13 de Dezembro em 1943, conhecido por “Segunda-Feira Negra”, os nazis cometeram uma das terríveis atrocidades da Segunda Guerra Mundial: o assassinato de cerca de 500 homens e crianças.

O museu / escola primária preserva a terrível história desta pequena povoação, primeiro no início do século passado, onde, pelas fotografias e documentos, quase só vemos semelhanças com uma qualquer das nossas vilas do interior do país do mesmo período (mesmo as pessoas são parecidas connosco), e depois, com o início da guerra, que naquele canto da Europa só se fez sentir verdadeiramente com a invasão da Grécia pela Itália. É nessa altura que tudo muda, a começar pela ocupação de Kalavrita pelos italianos em Maio de 1941 (que chegam a transformar a escola primária e pátio de recreio num de campo de concentração). Os italianos mantiveram o controlo militar do Peloponesso até ao Verão de 1943, aquando da capitulação da Itália. Depois, abandonaram a Grécia. As forças alemãs passaram então ao ataque, numa tentativa de tomar o mesmo território. Para os nazis, a Resistência grega era uma ameaça crescente, quer por estar espalhada por toda a região em volta de Kalavrita (montanhas quase inacessíveis), quer pelo receio de que, segundo rumores, os Aliados estariam a preparar uma invasão pelo sudoeste do Peloponeso. Em Outubro de 1943, a Resistência conseguiu capturar  83 soldados alemães. É possível que este facto, e o malograr das negociações que se seguiram, tenha contribuído para aumentar os receios e frustrações alemãs quanto ao objectivo de um controlo rápido do Peloponeso, enfurecendo os invasores mais ainda. O certo é que, depois disso, os alemães decidiram por em prática aquilo que ficou conhecido como “Operação Kalavrita”, desenhada há muito pelos oficiais nazis e a ser executada pela Wehrmacht (i.e., o conjunto das forças armadas alemãs unificado por Hitler desde 1935 e que agregava o exército, a marinha e a força aérea), passando a pente fino várias vilas e aldeias da região em busca de membros ou apoiantes da resistência sem olhar a meios. A 7 de Dezembro, na montanha de Helmos, a Resistência executou os 83 soldados nazis cativos. No dia seguinte, os oficiais alemães emitiram uma ordem de execuções em massa para as aldeias de Kerpini, Roghi, Zahlorou, Souvardo, Vrahni e para o Mosteiro Mega Spileo. A 9 de Dezembro, chegavam a Kalavrita.

Primeiro, disseram à população que procuravam apenas os membros da Resistência. Depois, exigiram que lhes revelassem o paradeiro dos mesmos. Depois, incediaram o hotel e algumas casas que lhes pareceram suspeitas. Depois, impuseram um recolher obrigatório e a proibição de sair da vila. Seguiu-se a pilhagem de tudo o consideraram de valor, bem como a execução todos os animais. Contudo, a 12 de Dezembro, perante uma população cada vez mais aterrorizada, anunciaram que sairiam de Kalavrita no dia seguinte.

A 13 de Dezembro, segunda-feira, ao nascer do sol, os alemães fizeram os sinos da igreja soar descontroladamente, para que toda a população se reunisse. Depois, de armas em punho, procederam como nas hediondas histórias que já conhecemos sobre os campos de concentração, separando toda a população: os homens e os rapazes (com mais de 13 anos) foram obrigados a entrar para as duas salas da direita da escola primária, e as mulheres e crianças para as outras duas, à esquerda. Depois, enquanto este último grupo ficou trancado e vigiado dentro da escola, levaram o grupo dos homens e rapazes pela porta das traseiras para o monte Kapi e executaram-nos. Depois atearam fogo a toda a vila. Desesperadas, ao aperceberem-se das chamas e do fumo sufocante, as mulheres conseguiram finalmente derrubar as portas da escola e fugir. Aguns alemães ainda se encontravam à volta da escola, mas não dispararam. Bebiam vinho e contemplavam o caos e a destruição. Alguns, riam-se. Só mais tarde estas mulheres descobririam os corpos dos filhos e dos maridos, dos pais e dos irmãos, dos amigos, todos juntos numa grande poça negra no sopé do monte Kappi.

No museu, há testemunhos impressionantes em vídeo (legendados em inglês) dos sobreviventes, sobretudo destas mulheres: da absoluta violência de tudo aquilo, da descoberta dos corpos, do choque, e depois do esforço doloroso e inimaginável de, sozinhas, os arrastarem pelo chão até ao cemitério, um a um, com a ajuda de alguma manta ou cobertor que não tivessem ardido no incêndio, e de como servindo-se apenas de paus ou mesmo de mãos nuas, tentavam partir o chão gelado (o inverno já se tinha instalado em força) para enterrar os cadáveres, antes de os cães esfomeados e das aves de rapina aparecerem. E falavam também na vida depois desse dia, da miséria, da fome...

A última sala do museu, quase sem luz, está coberta por fotografias com os rostos dos mortos. Quase cinco centenas. Mas de muitos não se encontrou qualquer imagem. Desses, está só um espaço em branco e um nome numa grande placa. No centro da sala, numa caixa envidraçada ao nível do chão, jaz uma bandeira nazi.

Ao sair do museu, uma placa convida-nos a ir até ao lugar da execução, no monte Kappi (agora um memorial, com o nome de Calvário), e a acender uma vela. Não é longe, apenas umas centenas de metros.

Trata-se de um monte quase nu, rodeado de ciprestes e coroado por uma grande cruz branca, com a data 13-12-43 feita com pedras.

Na base do monte há uma placa com inscrições aos mortos, uma escultura de uma mulher vergada de dor (“Doleful Stony Mother”) 

e uma capela minúscula. O mais comovente desta capela é o tecto, tornado invisível sob o peso de centenas de lanternas ortodoxas prateadas.

 Ao deixarmos este lugar, lá do alto, lançámos um último olhar, mais demorado, sobre a vila, com as grandes montanhas ao fundo e o desfiladeiro de Vouraikos.

 Ricardo Sousa Alves

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Este livro é considerado por muitos um clássico no que diz respeito a história da Grécia Antiga. Percebe-se porquê. É de leitura apaixonante e cativante. No entanto, parece demasiado panfletário. Nos livros de história às vezes fica-se a perder por serem demasiado antigos e aqui há um pouco essa sensação, sendo que o livro é dos anos 50 do século passado. Apesar de Kitto não evitar temas incómodos (a situação da mulher e dos escravos na Grécia antiga é sempre um tema que se pega com pinças nos nossos tempos de politicamente correto), há muito pouco de visão crítica e muito de tentativa de desculpar tudo, nem sempre com os argumentos mais convincente.

Mas repito: é uma leitura apaixonante.

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Pronto, sim, eu sei que sou suspeito... Tudo o que tenha a ver com a Grécia faz-me sempre ficar em pulgas. Mas não posso deixar de estar completamente rendido com este livro. Depois de ter lido o Millenium, de que falei aqui há uns tempos, decidi passar logo a outro do Tom Holland. Nem sequer me tinha apercebido que este livro, apesar do título, é tanto sobre o império Persa como sobre a Grécia antiga. Depois de uma introdução à Pérsia e à forma como o império se constituiu, o livro concentra-se nas grandes batalhas entre gregos e persas.

Portanto, temos aqui a batalha de Maratona (para quem não sabe, o termo "maratona", aplicado à corrida, vem desta batalha em que foi preciso percorrer a distância entre a Maratona e Atenas para salvar a cidade), a das Termópilas (da famosa história dos 300 guerreiros espartanos) e a de Salamina. O relato é tão intenso e vibrante que, às tantas, parecia que já não sabia a história e de como tudo ia acabar.

Mas o melhor de tudo é que ainda há mais livros do Tom Holland para ler!

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Há livros que eu leio por obrigação. Quer dizer, não é propriamente o livro, mas sim o tema. Quando leio livros de história eles forçam-me a ler outros, empurram-me numa direção ou noutra e, portanto, ler história é cair numa teia infindável. Mas a verdade é que é isso mesmo que eu quero, ir descobrindo cada vez mais.

Este Millenium veio dessa necessidade de entender um pouco mais o que é que aconteceu na Europa da idade medieval. Desta vez não centrado no império bizantino mas com uma perspetiva mais abrangente (este livro foi comprado ao mesmo tempo que o Byzantium de que aqui falei há uns tempos). Quando lhe peguei, foi a medo. O tema é, para mim, um bocado aborrecido, confesso. Ainda por cima, por mais que explorasse um pouco o livro, não conseguia perceber muito bem qual era o período histórico abordado. Mil anos? O ano mil?

Por isso, posso agora dizer que não podia ter tido mais sorte. Conheço o Tom Holland do Rubicão que não li, mas fui ouvindo em audiolivro, e sobre ele tinha uma excelente impressão. Neste, fiquei rendido. Tom Holland sabe criar uma trama à volta da história que torna tudo muito mais fácil, e é um período bem turbulento e complicado.

O livro centra-se no ano 1000, o ano do fim do mundo, como muitos acreditavam. A partir daí, Holland analisa os séculos que antecederam o milénio (começando, mais ou menos, com Constantino, e atravessando rapidamente o declínio de Roma). O foco passa depois pelas tentativas de reconstituição do império romano no ocidente, passando em revista os intrincados tempos de Carlos Magno, de Otão (os vários), das conquistas dos normandos, das conquistas dos vikings, da descoberta da Islândia, das alterações no poder em Inglaterra, e muito mais. Mas tudo isto sempre em paralelo com o que ia acontecendo em Roma, nomeadamente com as figuras dos papas. Nunca me interessei por nenhum papa e, neste momento, há dois ou três que me parecem ter sido figuras fascinantes.

Depois do ano 1000, e de o mundo, afinal, não ter acabado, Holland prossegue e só termina a sua narrativa em 1099, com a reconquista de Jerusalém. Eu fiquei cheio de vontade que o livro continuasse porque ler história assim é tão empolgante que se fica sempre insatisfeito. Mas não faz mal, há mais livros do autor e, para já, o Fogo Persa é o que está na minha agenda. Volto sempre à Grécia, portanto.

Nota: li a edição inglesa porque comprei o livro em Londres, mas existe edição portuguesa.

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Enquanto os corpos jaziam a céu aberto, as mulheres e raparigas foram obrigadas a deitar-se de rosto para baixo, sobre os cadáveres viscosos e nojentos. Com as coronhas das espingardas, os milicianos empurraram os rostos das suas vítimas contra aquela putrefação infernal. Desta forma os restos mortais enfiavam-se nas bocas e nos narizes delas. 64 mulheres e raparigas pereceram em consequência deste ato "heroico"(… )polaco.(testemunho anónimo)

 

Hesitei muito em retirar uma citação deste livro. Pensei em retirar várias, pensei em não retirar. Depois achei que é importante. Porque este livro denuncia tanta coisa, em tantos países, que é difícil aguentar. Este episódio, para o qual, como em tanta coisa relacionada com este assunto, não há provas (mas não é difícil de acreditar em bem pior que isto), não é um caso isolado. Faz parte de um período da história bem concreto e real, o qual não ocorreu assim há tanto tempo. Mas há um problema, é que este é o período para o qual muitos de nós estão habituados a olhar como o momento da celebração, da festa, da libertação, foi tudo menos isso. Este livro relata o que aconteceu na Europa entre 1945 e 1949. E a grande festa que houve foi a da vingança, do caos, do horror.  

 

Há uns poucos anos, a pretexto de uma viagem que fiz à Normandia, li o livro Europe at War de Norman Davies. E esse livro foi responsável por uma mudança enorme na forma como sempre olhei para a II Guerra Mundial. Na altura, deixei aqui um pequeno texto a dar conta disso. Mas é com o tempo que estas coisas mais evoluem e, de facto, continuo a ter essa visão diferente, em que o fim da guerra não foi bem em 1945, e que o fim da guerra não foi bem uma coisa boa para todos. Sendo que nós, deste lado da cortina de ferro, ficámos numa posição muito mais confortável. Agora, com este Continente Selvagem percebi ainda melhor o quanto a minha visão estava distorcida. No fundo, a Europa ocidental conta a história da vitória em meia guerra, nunca fala da guerra inteira.

 

O fim da guerra trouxe o desenvolvimento espetacular à Europa Ocidental (muito ajudada pelo Plano Marshall) e mergulhou a Europa de Leste nas trevas da opressão soviética. Apesar das operações militares incríveis que houve na Europa Ocidental, apesar da luta heroica dos aliados, e apesar da resistência tenaz dos povos, só meia europa se libertou. As festas que associamos a 1945, as comemorações de vitória, a alegria das pessoas, a liberdade, tudo isso é uma imagem que reflete uma realidade mas esconde outra, porventura muito mais importante, a da vingança.

 

Na introdução deste livro, Lowe começa por nos pedir que imaginemos um mundo sem instituições, sem fronteiras, sem governos, sem escolas, universidades ou livrarias, sem cinema ou teatro, sem informação, sem transportes. Na verdade, não é imaginação, é um regresso ao passado “a história da Europa no período imediatamente após a guerra não é, como tal, uma história de reconstrução e reabilitação - é, antes de mais, uma história de queda na anarquia”. O autor diz que este é o único livro dedicado a analisar em pormenor os anos a seguir à guerra (há outros livros, nomeadamente o Pós-guerra de Tony Judt, mas a análise é mais abrangente e não detalhada).

 

Lowe não nos conta grande coisa sobre como a Europa se reergueu depois da guerra. Pelo contrário, conta-nos como ela se afundou tanto como durante a guerra, ou até mais, em alguns casos. A certa altura, este livro parece mais um desfile de horrores, um verdadeiro catálogo de crueldade, tortura, intolerância, crime. A europa mergulhou, depois da guerra, num caos absolutamente horrendo. E, claro, tudo foi muito pior a leste, nessa Europa que só se libertou décadas depois e que, agora, felizmente (goste-se ou não) está integrada (mal ou bem) na União Europeia. 

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A história do império Bizantino é bem capaz de ser um tema muito pouco apelativo. Por um lado, é muito pouco conhecido, pelo menos visto deste canto da Europa. Por outro, muitos foram os historiadores que denegriram o próprio interesse de se estudar este período da história.

A mim, moveu-me a curiosidade do costume, ou seja, Grécia e Roma levaram-me a Bizâncio. No fundo, quis compreender melhor o que é que aconteceu à Civilização Romana (que, simplificando, já tinha incorporado a grega) quando o Império colapsou. É verdade que parte dessa continuação da história está no continuar a estudar a história de Europa. Mas, e a Grécia? O que aconteceu aos gregos quando Roma “acabou”? E que divisão foi essa entre império romano do ocidente e império romano do oriente? Então mas o império romano acabou mesmo, ou não? Como se vê, havia uns buracos por preencher… Em português não encontrei nenhum livro, assim de repente, que me pudesse explicar de forma sintética mas esclarecedora o que foi o Império Bizantino e se seria ele que ia responder às minhas dúvidas. Bom, acabou por ser no itunes que encontrei uma espécie de resposta. Fiz download de uma palestra de uma professora que falava por ocasião de uma exposição sobre o Bizâncio, creio que em Londres, mas já não me lembro bem. Era muito engraçada a introdução dela. Explicava que um dia uns construtores que andavam lá pela faculdade e lhe bateram à porta do gabinete para perguntar o que era isso de “Professora de História Bizantina”, o que era isso de bizantino, que tinha escrito na porta do gabinete. Parece que da conversa resultou um desafio “porque é que não escreve algo sobre isso?”. E Judith Herrin ficou a pensar no assunto - como apresentar Bizâncio a quem não conhecesse grande coisa sobre o assunto. Lá pensou e lá escreveu um livro. Livro esse que eu não conhecia e, na verdade, não procurei. Ouvi este podcast no ipod quando andava na rua e a coisa passou.

Alguns meses depois, numa livraria de Londres, encontrei este livro. O tema Bizâncio estava pendente e eu até o ando a reservar para quando um dia visitar a Turquia. Quando comecei a ler a introdução apercebi-me de que era a mesma história que tinha ouvido no podcast. Aquele era, portanto, o livro que a professora tinha escrito na sequência do desafio dos construtores. Claro que não resisti. E apesar de ter demorado (a verdade é que não fazia sentido ter lido este Bizâncio sem fazer toda uma outra série de leituras prévias sobre a Grécia e Roma - muitas delas, fui dando conta aqui), li-o agora e em muito boa hora (embora a viagem à Turquia ainda não esteja programada…).

Com isto tudo, ainda não falei do livro que é, de facto, uma excelente introdução a Bizâncio. Judith conduz-nos com uma mestria rara. A estrutura do livro é a sua grande força porque consegue ir construindo, através de camadas cuidadosamente pensadas, um fio condutor em que somos levados a compreender a importância do império no contexto da Europa. A sua afirmação de que a Europa não existiria sem o papel protetor de Bizâncio no conter da “ameaça” árabe, pode parecer exagerada, mas leva-nos na direção certa para reconhecer o contributo de Bizâncio para a história

Tudo começa com Constantino e a formação de Constantinopla. É a partir daí que a história da cidade é também a história do império. Uma história de lutas e de um quotidiano surpreendente. Há capítulos dedicados aos eunucos, ao papel das mulheres, há a melhor explicação que já vi sobre a “guerra” dos iconoclastas, há o saque perpetrado pelos cruzados, há a conquista final pelos otomanos. Há tudo isto tudo em capítulos curtos e muito bem estruturados (fiquei com a sensação de que podem ser lidos separadamente de forma eficaz, até porque a autora remete de uns para os outros para aprofundamento de temas).

Basicamente, não podia ter tido mais sorte em encontrar este livro. 

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Este é um livro de antropologia, embora me custe um pouco atirá-lo para uma categoria só. De qualquer forma, a antropologia também não é propriamente uma área estanque, pelo que o seu uso aqui deve ser encarado nessa lógica mais abrangente. Jared Diamond resolveu pegar naquilo que sabe de antropologia, na experiência que tem (e é enorme), em particular no seu conhecimento de povos que, ainda hoje, vivem de forma próxima dos “primitivos” (mais um conceito que estou a usar de forma simplória) e comparar, em várias áreas, a vida desses povos, e de outros dos quais há memória histórica, com as “nossas” sociedades ocidentais (ou ocidentalizadas).

As comparações são a vários níveis: como são tratadas as crianças, como são tratados os idosos, a utilização da linguagem, a forma de administração da justiça, a organização e delimitação do território, a relação entre as pessoas, etc.

O que realmente interessa é o que o autor no vai contando. As “lições” que ele retira, ou seja, aquilo que deveríamos trazer das sociedades mais antigas para as nossas, isso já é uma outra história. Para além de parte do exercício se limitar ao óbvio (páginas e páginas sobre a relação do homem com o sal na alimentação para dizer que não devíamos consumir tanto sal), há uma outra parte pouco convincente ou até mesmo inconclusiva.

Mas, na verdade, há livros que são tão interessantes que se lhes perdoa tudo. Este é um desses. Tem excessos, tem exemplos a mais, tem posições muito pouco defensáveis, tem uma tese central que está pouco sustentada e não serve para muito. Tem isso tudo. Mas é uma leitura absolutamente enriquecedora.

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Há sempre um problema em ler história recente. Neste caso, ler história que ainda está a acontecer. Mas, pior que isso, é não ler nada e esquecer completamente a mais básica ordem cronológica. Todos os dias vejo gente a falar da situação política, ecconómica e social sem um mínimo de rigor ou de verificação factual. Mas, enfim, vivemos num tempo em que o protagonismo dos treinadores de bancada atingiu dimensões insuportáveis. Mas adiante, este post não é sobre isso.

 

Gavin Hewitt, editor para a Europa da BBC, escreveu neste livro uma história da crise europeia dos últimos 4 ou 5 anos. Ou seja, aqui conta-se a história de como a Espanha, a Irlanda e a Grécia se afundaram e necessitaram de resgates financeiros. Também conta sobre Portugal mas parece mais um parêntesis do que outra coisa qualquer quando comparado com o destaque dos países referidos.

 

A estrutura, embora com o mérito de querer ser temática e “original”, acaba por enfraquecer o livro. O autor tenta levar-nos a ver a crise a partir de ângulos diferentes. Ora, o ponto de vista é a Irlanda, ora é a Grécia, ora é Itália. O problema é que estes pontos de vista cruzam acontecimentos e, portanto, algumas vezes vemos a mesma coisa a ser explicada em mais do que um capítulo, e sem que o tal ponto de vista acrescente algo de interessante ao acontecimento. Cheguei a ter a sensação de que já tinha lido páginas inteiras noutro capítulo, o que não é nada bom. Mas a verdade é que a história é contada de forma tão entusiasmante que depressa se fica novamente empolgado com o que vem a seguir.

 

Acho que este livro serve para muita coisa:

 

- explica como é que se processam muitas das decisões a nível europeu (era tão bom que as pessoas percebessem a complexidade do assunto em vez de ficarem pela crítica fácil de que “eles não fazem nada” ou de que a Merkel é a “má” e pronto)

 

- demonstra como os povos dos países intervencionados beneficiaram e abusaram de uma série de facilidades e como isso os colocou na posição em que se encontram. Há uma coisa que me arrepia mais do que tudo na forma como as pessoas reagem ao que aconteceu: o dizer-se que a culpa é dos políticos e que o resto da população é inocente. Bom, os exemplos são mais que muitos, mas no caso grego até fazem rir, fazem mesmo! A forma como os gregos fugiam (e fogem) aos impostos é uma das razões para que o país esteja como está. Mas, lá como cá, toda a gente diz que a culpa é SÓ dos políticos (lá não sei, mas em Portugal até há quem aponte o simplório dedo a apenas um deles, seja Sócrates, seja Cavaco ou, melhor ainda, Passos, mesmo que só tenha vindo depois)

 

- revela a forma como os grandes beneficiados dos exageros do sul foram os países mais ricos e como é que eles reagem a querer disciplinar aqueles que ajudaram a exagerar

 

- Hewitt também se detém em alguns apontamentos mais biográficos sobre as grandes figuras da Europa Merkel, Sarkozy, Papandreou, etc. E, para quem quiser rir, rir muito (ou talvez chorar, chorar muito), até tem o Berlusconi…

 

No balanço final, é uma leitura absorvente e profundamente interessante. Não é um livro com uma tese nem toma, por aí além, posições. Mas ajuda muito a quem quiser construir uma opinião fundamentada, com alguma análise histórica e, acima de tudo, bom senso. 

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Muito interessante o conceito deste livro. Imagine-se Marco Aurélio, o imperador-filósofo de Roma, ainda criança, a passear pela cidade enquanto conversa com o seu tutor.  Pelo caminho, vão dialogando e é contada ao jovem Marco a forma como o império romano foi evoluindo. É um livro bastante livre, fluindo ao ritmo das perguntas do futuro-imperador-ainda-criança.

É uma leitura curiosa e rápida para quem já conhece bem o tema, mas não acrescenta grande coisa. Para quem o usar como introdução, provavelmente, vai ficar muito bem servido.

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