Este é bem capaz de ser um livro-sensação, especialmente por ter conseguido, sendo o autor estreante, arrebatar o Man Booker Prize. E a verdade é que este é um livro de sensações. Nele se mergulha na Índia contemporânea, bem no meio de todas as suas idiossincrasias. Já li muitos livros só por causa dessa vertente, a de me transportar para um cenário que eu não conheço, permitindo-me aprender dessa forma. Mas raras foram as vezes em que efectivamente aprendi mesmo, em que fui transportado para lá, para pequenos detalhes e para grandes traços. É esse o grande mérito desta obra.
O ponto de partida é surpreendente. O Tigre Branco é um empresário indiano e, sabendo que o primeiro-ministro da China vai fazer uma visita à índia, resolve escrever-lhe para lhe contar tudo sobre o seu país. Faz isto contando a sua história particular, o que não só é uma excelente forma de se compreender um certo espírito indiano, como ainda nos permite, pelas situações que ele observa, conhecer muito mais do que apenas a vida dele.
Adiga leva-nos a conhecer a Índia profunda e pobre e a Índia sofisticada e rica. Mostra-nos as possibilidades de ascensão social que existem e o imobilismo do sistema de castas. Denuncia a corrupção de certas classes e ilustra a honestidade de outras. O mosaico indiano não é só fascinante, é também quase impossível de retratar. Mas é isso que neste livro é conseguido de forma magistral. Não é pela escrita que esta é uma grande obra mas sim pelo que consegue fazer. Adiga cria um enredo que lhe permite falar de tudo sem que nos percamos no meio de toda a confusão que pode ser falar sobre a Índia. Para além disso, não se limita ao quotidiano das pessoas, ainda consegue acrescentar elementos que nos lançam pistas sobre o futuro. Numa altura em parece cada vez mais próxima a ascensão da Índia (e da China) como superpotência mundial, Adinga lança dados sobre essa questão, e não isentas de polémica. Por exemplo, apontar como desvantagem indiana, face à China, a democracia, é, no mínimo, uma atitude corajosa e que deveria obrigar mais a reflexão do que a indignação (porque são apontados os grandes defeitos e fragilidades da democracia indiana).
Em suma, este livro é excelente se o lermos de um ponto de vista de entretenimento. É excelente se o lermos enquanto documento sobre a Índia contemporânea. É excelente se o virmos como obra de ficção. Ah, e ainda pode ser lido como policial, com um assassino e tudo.
Há tantos livros que tentam ter dentro de si coisas a mais, Este, parece poder conter tudo e ainda lhe sobra espaço. Surpreende a sua pequena dimensão (cerca de 240 páginas).
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