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Daqui a um mês vou fazer um pequeno city break à cidade que há mais anos quero conhecer. Preparação:
- ver as séries: Forbryldesen (The Killing) e Borgen
- ler Kierkegaard
- ler um livro sobre a história do país
Chega para perceber onde vou?
O ponto de partida deste livro não podia deixar de me chamar a atenção: houve um período do tempo, no século V a.c. em que um homem poderia, ao longo da sua vida conhecer figuras tão ímpares como Zoroastro, Péricles, Confúcio ou Buda. É improvável, evidentemente, desde logo porque o espaço físico que seria necessário atravessar para conhecê-los era incrivelmente grande (hoje seria fácil mas, na altura, devem ter sido poucos, os que alguma vez foram da Grécia até à China, passando pela Pérsia e pela Índia). Portanto, Gore Vidal precisou de criar uma forma de conseguir tornar esta história possível. Para isso, criou o personagem Cyrus Spitama, neto de Zoroastro que, ao longo da vida, ao serviço dos reis persas, vai viajar pelo mundo enquanto embaixador. A partir daqui consegue estruturar a história em vários eixos:
- Cyrus, como neto de Zoroastro, tem um interesse particular na religião e, em particular, no enigma da Criação. No fundo, aproveita as suas viagens, e quem vai conhecendo, para inquirir sobre a origem do mundo. Desse ponto de vista, o livro acaba por ser uma busca que tem como interessante resultado dar-nos uma síntese de religiões comparadas.
- Cyrus nasce na Pérsia e está muito bem posicionado na sociedade, o que lhe permite estar perto dos decisores nomeadamente os reis Dário e Xerxes. As suas observações, feitas a partir desse prisma, dão-nos uma visão crítica e diferente de um período que estamos habituados a ver do ponto de vista ocidental (ou dos gregos, que olhavam para os persas como inimigos e bárbaros)
- A observação que Cyrus faz dos sítios por onde passa é-nos dada, muitas vezes, em forma de diálogos, pelo que são os próprios “locais” (da Índia, da China, etc) que nos apresentam e explicam os seus hábitos e costumes. Cyrus não deixa de ser um observador-comentador mas dá espaço para que o ponto de vista seja o do “outro”
O resultado final é, sem surpresas, desigual. O livro tem momentos muito bons. Os tempos que Cyrus passa com Confúcio são, para mim, o melhor da obra. É aí que o livro ganha alguma alma, no entanto, já está perto do fim. De resto, a ambição de abarcar tal extensão geográfica num tempo tão remoto faz com que a história seja por vezes excessivamente esquemática. E, paradoxalmente, acaba por ter momentos profundamente aborrecidos por servirem para dar consistência ao que vem a seguir - são necessários, reconheço, mas afetam o equilíbrio do romance.
Não encontrei este livro em português, pelo que li no original. Não sei o suficiente de inglês para perceber se há ali um trabalho de fazer soar a “antigo”. Mas que tive alguma dificuldade em acompanhar, lá isso tive.
Um livro como este é um feito notável. Está cheio de defeitos, e é preciso ter um cuidado muito grande para não confundir a ficção com a história (até porque nem a história se entende em relação a muito do que é relatado aqui, em particular no que diz respeito à Índia e à China). Mas enriquece quem o lê, mesmo que, como me aconteceu, se demore vários meses.
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