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Talvez essa atitude hoje se tenha perdido um pouco. A vontade de ver, a falta de espírito crítico, o comodismo, talvez tenham feito com que se perdesse a noção de que, às vezes, "retirar-se" é uma atitude ativa.
Não vou falar do governo e da política que tem sido seguida. Não vou porque isso implicaria muito tempo, talvez muitos posts. Fazer um juízo crítico da atualidade deveria exigir uma atitude de reflexão, de ponderação séria. E tenho visto muito pouco disso. A maior parte das opiniões que tenho visto são tão pouco consistentes e tão pouco ponderadas que me obrigariam a começar a um nível demasiado elementar.
Quero, por isso, cingir-me a um episódio simples, a manifestação que vimos em Lisboa ontem. Portanto, sem comentar as razões dos manifestantes, e aceitando que é normal, e saudável, que as pessoas lutem por aquilo em que acreditam (mas lamentando que não reflitam seriamente sobre isso), quero apenas perguntar: se estou numa manifestação e aparecem pessoas de cara tapada, se estou numa manifestação e uma série de gente começa a usar da violência mais primária e ilegítima, devo continuar lá? O que me assusta no que aconteceu não é o excesso de uma minoria, o que me assusta é a grande maioria que lá permaneceu, assistindo ao que se passava sem tomar a atitude de se retirar. Esperava ver o largo meio vazio, mas não. Milhares de pessoas aceitaram estar presentes. Ter razão implica, por vezes, dizer não. Lutar implica, por vezes, retirar-se, não aceitar ser cúmplice de atitudes condenáveis.
"O talento essencial para um bom escritor é ter implantado em si próprio um detetor de merda à prova de choque. É esse o radar do escritor e todos os grandes escritores o tinham"
Hemingway in Entrevistas da Paris Review
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