Há livros que nos vão escapando, escapando como se não quisessem ser lidos. E nem o facto de os termos na estante nos garante que a eles poderemos aceder.
O que se passa entre mim e o Cem anos de Solidão é que, incrivelmente, mesmo tendo tentado, nunca cheguei a lê-lo. Comecei, não sei quando, mas deve ter sido por volta dos 16 anos. Perdi-me de tal forma na teia de personagens com o mesmo nome que acabei por concluir que teria que começar de novo – e tirar apontamentos. Bom, a verdade é que acabei por pô-lo de lado para mais tarde recomeçar e foi passando o tempo. Acabei por ler outros livros de García Márquez mas sempre sabendo que o Cem Anos me aguardava.
Anos mais tarde, voltei a pegar no livro e comecei a lê-lo. E… perdi-o. Ainda hoje não sei onde foi parar, apesar de me lembrar perfeitamente de onde o guardei. Mas não está lá e, três mudanças de casa depois, não acredito que me pudesse ter escapado, se fosse humanamente possível encontrá-lo.
Por tudo isto, em boa hora apareceu a nova edição, ainda por cima com uma árvore genealógica da família Buendía, coisa que para um totó que não consegue acompanhar um livro com muitas personagens sem se perder, é quase motivo para o comprar, mesmo que já se tenha. Como eu sou esse totó e o meu se perdeu, assim vi o novo, assim o comprei. E estou a ler. E mais, estou perto do fim. A faculdade não me deixa descansar e, portanto, o tempo para leituras de ficção não abunda. Isto faz com que eu ande há mais de um mês a ler o Cem Anos, como se o título se transformasse na própria experiência de ler o livro.
Mas que experiência… Estou apaixonado pela personagem de Úrsula, leio com ternura e carinho as páginas onde ela está, anseio por saber mais, quero-lhe bem, enfim, toda uma série de sensações que poucas vezes tive em relação a personagens de livros. Aliás, se me perguntarem qual é a minha personagem preferida, eu não sei, não tenho, nunca tive. Mas esta Úrsula parece que me quer mostrar o que é isso de nos apaixonarmos por uma personagem de ficção. Seja então. Daqui a alguns (talvez muitos) dias, já terei terminado o livro. E nunca mais vou ver a Úrsula como a vejo agora. Não sei se algum dia poderei reler o livro, se foi tão difícil a primeira vez (e porque se é para reler, o Amor nos Tempos de Cólera estará sempre em primeiro lugar), o que sei é que dentro daquelas páginas está um daqueles livros que quase toda a gente gosta, que se oferece no Natal, nos aniversários, seja quando for. Porque o que ali está é um romance cheio de fantasia, de vida, de sentimentos, de pessoas completas e fascinantes, tudo o que a literatura tem de bom enquanto entretenimento. E, ao mesmo tempo, tanto mais, tanta alma e profundidade. Um livro que durará muito mais do que cem anos, que nunca deixa só quem nele pegar.
P.S. Quer dizer… o meu deixou-me… e, já agora, se alguém encontrar por aí o meu livro, diga-lhe que agora que sei o que tem dentro, gosto ainda mais dele).
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Há uns meses li o livro, e conforme dizia na altura, estava ansioso por ver o filme. E ainda bem que o fiz, David Fincher criou aquilo que faltava no conto de Fitzgerald e, algo surpreendentemente para mim, de uma perspectiva mais humana do que “emocionante. É que os filmes de Fincher costumam ser desafiantes mas mais pelo lado de thriller que, normalmente, têm. Neste Benjamim, temos um filme profundamente humano, irresistivelmente enternecedor e que percorre a história deste Benjamim, expandindo-a para onde era inevitável que a imaginássemos. Não querendo revelar o argumento, resta-me dizer que a forma como a história é contada traz elementos novos, ausentes do conto, que elevam este filme a um daqueles casos raros em que o objecto cinematográfico vale mais do que o livro.
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